quarta-feira, 11 de abril de 2007

Intelectuais da mídia, os novos reacionários

Intelectuais da mídia, os novos reacionários

Ilusões perdidas, desencanto ou, pura e simplesmente, oportunismo? Por que teriam os intelectuais franceses de hoje dado uma guinada à direita? Le Monde diplomatique fez uma pesquisa cujo resultado é publicado nesta edição

Maurice T. Maschino


http://diplo.uol.com.br/2002-10,a463

"Este mundo nos escapa".

Por que acumulamos?

O fato de que a competição generalizada no planeta inteiro se coloca como motor do progresso. Não é mais como no século 18, a representação de uma finalidade superior, de um objetivo grandioso, que seria a emancipação dos homens e a sua felicidade. O motor do progresso é simplemsente a necessidade, induzida pela competição, de avançar para não cair. No fundo, as empresas hoje estão na situação de alguém que anda de bicicleta e que, se não avança, cai. O fabricante de telefone celular sabe que se em três meses seu aparelho não for moderno ele estará acabado.
Estamos numa lógica que, contrariaramente ao que pensam os militantes antiglobalização, as primeiras vítimas são os chefes de empresas, as pessoas que estão nessa lógica. Os antiglobalização imaginam que por trás do mercado financeiro há pessoas que comandam tudo. Como em Wall Street, seriam os grandes financistas e capitalistas que mandam. Eles têm ainda o modelo marxista na cabeça: por trás de superestruturas há infraestruturas. É um enorme erro. Se houvesse pessoas que, por trás do mercado financeiro, comandassem tudo, seria uma boa notícia. Mas não é nem isso. Obviamente que os capitalistas tiram proveito, isso é evidente. Mas, diante de uma onda gigantesca, se você tem uma prancha de surf pode deslizar nela ou cair. Essa é a situação de um chefe de empresa hoje. A globalização produz ondas gigantescas permanentemente e o empresário não tem outra escolha do que surfar ou ser varrido. Ele não tem nenhuma liberdade. Ele pode ganhar ou perder, mas o curso do mundo lhe escapa.
Como escapa aos jornalistas. Num jornal ou num canal de tevê você está na lógica da audiência, que é a mesma lógica dos mercados financeiros, da globalização, da mercantilização do mundo. O problema da globalização é o de que o mundo nos escapa. Ele é a imagem dos grandes mitos de Frankestein e do aprendiz de feiticeiro, mitos da despossessão, que contam a história de uma criatura que escapa ao seu criador, e é isso que vivemos hoje. Não é como dizem os militantes antiglobalização: se houvesse responsáveis por trás, poderíamos prendê-los, fazer a revolução, enforcá-los e tudo estaria acabado. Estamos num processo anônimo e cego.
É assim para as deslocalizações de empresas, são processos automáticos. O chefe de empresa que não deslocalizar sua produção para a Tunísia, China ou outro lugar, moralmente não estará fazendo seu trabalho, que é o de fazer com que sua empresa sobreviva e não o de dizer: "Vou manter minha empresa no meu país mesmo que ela termine em falência". Ele não é como o capitão do século 17 que deve afundar junto com o seu navio. Isso acabou. A grande questão política hoje é: como retomar o controle? É o problema n° 1 para todos os políticos do mundo.


Entrevista com Luc Ferry, "Viver no século 21, segundo Luc Ferry":
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1506795-EI6581,00.html

Luc Ferry: o amor é transcendente por emanar naturalmente do coração. É um fato.

Entrevista com Luc Ferry, "Viver no século 21, segundo Luc Ferry":
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI1506795-EI6581,00.html

Eu me situo no oposto dessas duas estratégias. Penso que Nietzsche tem razão quando diz que não podemos mais inventar ídolos no sentido de ideais metafísicos que servem para dar sentido à vida. Sou bastante nietzschiano nisso. Ao mesmo tempo, a conclusão de Nietzsche é a de dizer que não há mais transcendência, que todos os valores transcendentes devem ser descartados. Eu colocaria uma terceira via, que tomo emprestada, em parte, da fenomenologia de Husserl, mas mais para trás na tradição kantiana, que é o que se chama de transcendência na imanência. O século 20 foi nietzschiano, no sentido de que quebramos todos os ídolos: a tonalidade na música, a figuração na pintura, a cronologia e os personagens nos romances, mas também todos os valores morais, religiosos, políticos explodiram sob o golpe da desconstrução. Foi um século de desconstrução. Os filósofos dos anos 60, Jacques Derrida, Michel Foucault, Gilles Deleuze, Pierre Bordieu são desconstrutores, pessoas que quebraram os ídolos da religião e da metafísica. Muito bem, eles tiveram razão, eles quebraram tudo isso. O problema é que hoje sob essa terra que foi devastada, esse céu esvaziado, pois os ídolos desapareceram, vemos aparecer transcendências que não são mais da mesma natureza dos ídolos da metafísica e da religião, dos ideais que Nietzsche quebrou com seu martelo. Porque são transcendências diretamente enraizadas na imanência ao mundo da vida. Para pegar um exemplo simples. Quando você ama verdadeiramente alguém - sua mulher, seus filhos, irmão, irmã, pouco importa - , você faz a experiência de uma transcendência, de algo que faz você sair de você mesmo. O outro se torna eventualmente mais importante do que você, no limite, se torna sagrado, não no sentido sagrado do termo, mas no sentido de que você poderia sacrificar sua vida por ele.
Quantos pais de família estão dispostos a sacrificar suas vidas por seus filhos? Quase todos. Não se pode mais falar de egoísmo nesse nível, porque há uma transcendência. Mas essa transcendência não está enraizada num ídolo metafísico, como aqueles que Nietzsche quebrou com seu martelo, mas diretamente na imanência no mundo vivido, algo factual, da ordem de um fato que se constata. Da mesma forma que constato que dois mais dois são quatro e não posso fazer nada, isso me transcende, não é uma questão de gosto. Assim como constato que a verdade, a justiça, a beleza e o amor me transcendem. Mas essas transcendências são vividas na imanência do coração humano. Elas não estão ao alcance do martelo de Nietzsche. Ele não tem razão contra as transcendências que me interessam hoje e que dão sentido às nossas vidas.
A transcendência do amor não pode ser negada. Ele é um fato. Emana naturalmente de nossos corações, assim como a verdade, a justiça e a beleza.